O
Islamismo: origens e preceitos
Segundo
a apresentação geral o Islamismo surge como a terceira das três grandes
religiões monoteístas: após o Judaísmo, religião pioneira a crer em um único
Deus, o Cristianismo, que foi uma ramificação do Judaísmo até que Paulo de
Tarso o transformou em uma religião completamente – nem tanto – da anterior e o
Islamismo, surgido mais ou menos 600 anos após o nascimento de Cristo. Essa
colocação cronológica, embora didática, não corresponde necessariamente á
verdade. Se for analisado friamente o Islamismo irá se apresentar muito
parecido em seus contornos, em seu monoteísmo e em suas crenças básicas, com o
Judaísmo. E como o Cristianismo nada mais é do que um Judaísmo greco-romanizado, pode-se considerar que o Islamismo é uma
continuidade. Para os muçulmanos – seguidores do Islamismo – o Islamismo é a
mesma religião seguida por Adão e Eva e todos os profetas que lhes seguiram.
Esta religião, que sempre fora monoteísta, foi conspurcada ao longo do tempo,
tendo sido necessário o envio de profetas e mensageiros que tentavam orientar
os seres humanos no correto caminho do Deus Único. Por este motivo profetas
muito anteriores ao surgimento oficial do
Islamismo são reverenciados pelos muçulmanos e muito citados pelo Alcorão – o
livro sagrado do Islamismo: Adão, Noé, Abraão, Isaac, Jacó, David, Moisés e
Jesus. Todos estes profetas tinham uma lição básica aos humanos: adorar apenas
a Deus. Segundo o Islamismo, contudo, estes profetas foram desrespeitados e
desobedecidos e, como selo dos profetas, ou seja, como último e definitivo
mensageiro de Deus, foi enviado Mohammad, que em português é mais conhecido
como Maomé, para reorientar a humanidade e se constituiu no último profeta a
ser enviado por Deus. Portanto pode-se observar que o Islamismo, ainda que
oficialmente tenha surgido tempos depois do Judaísmo e do Cristianismo, nada
mais é do que a mesma mensagem enviada desde sempre por Deus, qual seja, o
Monoteísmo Puro.
Qualquer
explicação do que venha a ser o Islamismo está inevitavelmente atrelada a uma
biografia, ainda que sucinta, de Maomé. Como “fundador” do Islamismo, sua vida
é a própria história do surgimento da religião. O ambiente no qual foi criado e
suas condições de vida também servem de arcabouço para o que o Islamismo prega.
Em linhas gerais podemos dizer que Maomé nasceu por volta de 570 d.C. na cidade
de Meca, atualmente localizada na Arábia Saudita. Na época este país ainda não
existia e os árabes estavam divididos em uma miríade de tribos cercadas por
dois poderosos impérios: os persas a leste e os bizantinos a oeste. A infância
de Maomé foi difícil: antes mesmo do seu nascimento ele perdeu o pai e a mãe
morreu quando ele era apenas uma criança. Deixado aos cuidados do avô paterno,
Maomé também o perdeu precocemente. Foi então entregue aos cuidados do tio paterno
Abu Talib, que lhe seria de especial importância nos primeiros anos de sua
profecia.
Ainda
que pertencesse à grande tribo dos Coraixitas, que dominavam política e
economicamente a cidade de Meca, Maomé pertencia ao ramo pobre da tribo,
obrigando-o a trabalhar desde cedo. Como se tratava de uma região extremamente
seca, sem rios e praticamente nenhuma chuva, Maomé foi obrigado a seguir a
carreira do tio, que era líder de caravanas. Desde cedo acompanhava o tio em
suas viagens e logo passou a comandar ele próprio os negócios do tio. Sua vida,
nos primeiros quarenta anos, não foi em nada diferente dos demais homens da
região. As coisas começaram a mudar quando Maomé liderou os negócios de uma
rica viúva da região, chamada Khadija, que ficou encantada com a integridade
que Maomé demonstrou ao guiar suas caravanas e, apesar de mais velha, pediu o
futuro profeta em casamento. Este matrimônio concedeu a estabilidade financeira
da qual Maomé jamais desfrutara e proporcionou que ele se dedicasse a uma de
suas atividades preferidas: a meditação e a reflexão religiosa.
Cabe
um parênteses sobre a situação religiosa da Arábia no momento anterior ao
surgimento do Islamismo: a vida religiosa dos árabes girava em torno da Caaba,
um antigo santuário em forma de cubo que se localiza em Meca. Segundo os árabes
o santuário foi construído por Abraão com a ajuda de seu filho primogênito
Ismael. No interior da Caaba encontra-se a Pedra Negra, que segundo o Islamismo
é uma das pedras do Paraíso que caiu na Terra após a expulsão de Adão e Eva. A
princípio a pedra era branca, mas conforme os pecaminosos humanos a tocavam ela
se tornou negra. A princípio este
santuário fora dedicado exclusivamente ao Deus Único, mas, com o passar do
tempo, os homens foram se desviando do verdadeiro culto e incluíram uma miríade
de deuses no interior da Caaba, chegando ao número de 360 deuses, um para cada
dia do ano lunar. Além disso, havia imagens de Abraão, Jesus e outras pessoas
importantes. A presença da Caaba em Meca tornou a cidade um importante ponto de
peregrinação entre os árabes. Aproveitando-se disso, os coraixitas, que eram os
protetores do templo e, por extensão, da própria cidade, estabeleceram feiras
comerciais que coincidiam com os períodos de peregrinação, o que tornou não
apenas a cidade, mas principalmente seus guardiões, extremamente ricos e
influentes. Assim sendo, na época imediatamente anterior ao surgimento do
Islamismo – que os muçulmanos chamam de Jahiliya,
“Tempo da Ignorância” – o politeísmo estava arraigado na cultura árabe e fazia
a riqueza dos poderosos Coraixitas.
Voltemos
a Maomé: em um dos últimos dias do mês lunar de Ramadã do ano de 610, Maomé
retirou-se, como de costume, para uma caverna no monte Hira, próximo da Caaba,
onde pretendia refletir sobre assuntos religiosos. Em um determinado momento
Maomé percebeu a presença de mais alguém na caverna: um homem que o agarrou e o
apertou tão fortemente que ele pensou que morreria sufocado. Após soltá-lo o
tal homem disse-lhe Iqra – palavra
árabe que significa “Recita”, mas também pode significar “Leia”. Maomé
disse-lhe que não poderia recitar – ou ler – uma vez que era analfabeto.
Novamente foi apertado e após ser solto recebeu a mesma ordem: Iqra. Após nova negativa de Maomé, o tal
homem o agarrou novamente depois de uma terceira ordem Maomé percebeu que fluía
de sua boca palavras que ele jamais ouvira:
“Lê, em nome do
Senhor que criou,
Criou o homem de
um coágulo.
Lê, que o teu
Senhor é generosíssimo,
Que ensinou
através do cálamo,
Ensinou ao homem
o que este não sabia”.
Alcorão
Sagrado – Capítulo 96, versículos de 1 a 5.
Maomé
fugiu assustado. Temia ter sido afetado por algo que os árabes chamavam de Gin, ou gênios, espíritos que
atormentavam as pessoas. Durante dias ficou em dúvida se teria de fato recebido
uma revelação divina ou um mau presságio. Por fim, após ter sido acalmado pela
esposa, que lhe disse que um homem bom não poderia ter sido abandonado por
Deus, Maomé voltou a receber a visita do tal homem e foi tranquilizado: o homem
era de fato o arcanjo Gabriel, enviado por Deus com uma revelação para a
humanidade e doravante Maomé seria o profeta de Deus.
A
missão de Maomé, desde o princípio, jamais fora fácil: pregar o monoteísmo em
uma sociedade arraigada no politeísmo e lutar contra uma classe social que se
beneficiava profundamente dos lucros das peregrinações à Caaba que visitavam e
adoravam estes deuses. Maomé foi perseguido e ofendido pela sociedade de Meca.
Contava, contudo, com a proteção do tio Abu Taleb que, apesar de não ter se
convertido, manteve a proteção que lhe concedia desde criança. Esta proteção
foi importante para Maomé, pois ninguém ousaria fazer-lhe mal em respeito ao
velho Abu Taleb. Mas esta proteção não foi de muita valia para os seguidores de
Maomé que foram perseguidos e muitos mortos pelos coraixitas revoltados com a
pregação monoteísta. Maomé insistia que não se tratava de uma nova religião,
pois eram os mesmos ensinamentos de Abraão e de todos os profetas anteriores.
Maomé se via como profeta e sucessor de todos os profetas anteriores. Logo sua
crença ficou conhecida como Islamismo, palavra que significa paz e submissão,
no caso ao Deus Único. Os seguidores do Islamismo foram chamados de muslims, ou muçulmanos, palavra que
significa “aqueles que se submetem”,
no caso a Deus. Os coraixitas não se interessaram pela mensagem e um dos tios
de Maomé, Abu Lahab, foi particularmente rigoroso na perseguição ao sobrinho e
aos seus seguidores. Os muçulmanos começaram a fugir de Meca por medo das
represálias: muitos fugiram para a Abissínia, na África Oriental, onde foram
bem recebidos pelo rei local, que era cristão. Mas a situação em Meca se tornou
tão insuportável, principalmente após a morte de Abu Taleb, que Maomé percebeu
que deveria fugir para se manter vivo. No ano de 622 d.C., doze anos após a primeira
visita do arcanjo Gabriel, Maomé e vários muçulmanos fugiram para a cidade de
Yatrib, localizada ao norte de Meca. Este acontecimento, conhecido como Hégira, marca o início do calendário
islâmico. Em Yatrib Maomé estabeleceu a primeira comunidade islâmica e
construiu a primeira mesquita do Islamismo. Ali os muçulmanos podiam praticar
sua religião livremente, sem medo de perseguições, torturas ou morte. O nome da
cidade foi mudado para Medinat Al Nabil, ou simplesmente Medina, “Cidade do Profeta”.
Mas
a vida em Medina não foi um mar de rosas para os muçulmanos: em primeiro lugar
eles tinham de se entender com as comunidades judaicas da cidade. Maomé era
profeta do Deus Único, o mesmo Deus dos judeus e portanto tolerava os judeus.
Estes, no entanto, não aceitaram Maomé como profeta e não se converteram aos
muçulmanos e se ressentiam da dominação deles sobre a cidade. Pouco tempo após
a chegada dos muçulmanos eles se tornaram um problema e, com o tempo, foram
expulsos da cidade. Outro grupo interno que ameaçava os muçulmanos eram os
chamados hipócritas, pessoas que se
converteram ao Islamismo por interesse e que no fundo compactuavam com os
coraixitas. Para finalizar os coraixitas não aceitaram a fuga dos muçulmanos
pacificamente e organizaram inúmeras campanhas militares contra Medina. Ainda
que em números e condições inferiores, os muçulmanos conseguiram rechaçar todas
as incursões coraixitas e o número de muçulmanos, concomitantemente, aumentava
a cada dia. A situação se inverteu e no ano de 630 d.C. os muçulmanos marcharam
sobre Meca e conquistaram a cidade da qual haviam fugido oito anos antes, sem o
derramamento de sangue. Maomé se dirigiu à Caaba e a purificou dos ídolos
pagãos, destruindo as imagens dos deuses que ocupavam o seu interior. A partir de
então a religião se expandiu ainda mais, com tribos aceitando o Islamismo sem a
necessidade de intervenção. Maomé morreu no ano de 632 d.C. e a liderança da
comunidade islâmica passou para Abu Bakr, um dos primeiros convertidos ao
Islamismo e que se tornou khalifa –
Califa –, “Líder” dos muçulmanos.
Esta
brevíssima biografia de Maomé mostra apenas alguns aspectos do surgimento do
Islamismo. Convém a busca de fontes mais aprofundadas para um panorama mais
completo. Passemos agora aos principais artigos da fé islâmica. O mais
importante conceito da fé islâmica está na adoração do Deus Único. Não é
permitida a adoração de nada além de Deus, seja quem for, até mesmo Maomé. A
proibição de se reproduzir Maomé através de desenhos ou imagem tem
principalmente esta intenção: evitar qualquer tipo de veneração a seres
humanos, ainda que sejam importantes, pois a veneração é exclusiva a Deus.
Foram estabelecidos cinco pontos cruciais da fé islâmica, conhecidos como Pilares de Islamismo, que determinam a
religião islâmica:
1- Shahada (Juramento
de Fé): o juramento de fé é o primeiro passo para se tornar
muçulmano. Trata-se de duas frases que resumem a crença de todo muçulmano: “Juro que não há deus a não ser Deus e juro
que Maomé é o mensageiro de Deus”.
2- Salat (Orações): as
orações é o principal elo entre o homem e Deus, mostrando que ele é de fato
muçulmano – submisso a Deus. As orações se realizam cinco vezes por dia, em
horários de terminados.
3- Zakat (Ajuda aos
Necessitados): os muçulmanos que tiverem condições
devem ajudar os mais necessitados, seja com dinheiro ou com mantimentos. Mas a
ajuda só é obrigatória se o muçulmano tiver condições de ajudar o próximo.
4- Sujud (Jejum): em
lembrança da revelação que Maomé recebeu do arcanjo Gabriel, os muçulmanos
devem jejuar nos meses de Ramadã, desde o nascer ao pôr do sol: devem se abster
de toda bebida e toda comida, além de relações sexuais.
5- Hajj (Peregrinação):
todos
os muçulmanos, que tiverem condições físicas e financeiras, devem visitar pelo
menos uma vez na vida a cidade de Meca e circundar a Caaba. Meca é a cidade
mais sagrada para o Islamismo, pois foi lá que a religião surgiu e também lá é
a terra do profeta Maomé.
A
exemplo da biografia de Maomé, esta relação dos Pilares da Fé é extremamente
sucinta, sendo necessária a busca de bibliografia mais aprofundada para se
entender completamente.
Cabe
aqui também algumas palavras sobre o Alcorão e a Sunnah. O Alcorão vem da
palavra árabe Al Quran, “A
Recitação”. Após a morte de Maomé todas as revelações que ele recebeu foram
reunidas em um único livro para que os muçulmanos de todo o mundo a
conhecessem. Configurou-se no livro sagrado para os muçulmanos, reunindo 114
capítulos que versam sobre todos os aspectos da vida humana. No Alcorão
podem-se encontrar várias histórias que também estão presentes na Bíblia, tanto
no Velho como no Novo Testamento. Para o Islamismo o Alcorão é a maior
autoridade da fé, tudo que discorde dele é considerado falso.
A
Sunnah, por outro lado, é um relato de tudo o que foi dito e feito por Maomé no
que se refere à religião durante os 23 anos em que durou sua profecia. Uma vez
que o profeta é considerado o modelo de ser humano a Sunnah representa uma
espécie de “manual de conduta” de todos os muçulmanos. Esta Sunnah é
transmitida de geração a geração por uma linha de transmissores oficialmente
reconhecidos. O Alcorão serve como fonte de análise da Sunnah: se determinada
tradição difere do Alcorão é considerada equivocada. A Sunnah deu origem ao
termo “sunita”, que são os muçulmanos como um todo, uma vez que, para todos os
efeitos, os xiitas não são considerados muçulmanos, já que não seguem
obrigatoriamente a Sunnah.
David Barbosa
Miranda – Mohammad Daoud Abdallah.
Nenhum comentário:
Postar um comentário